OS PRIMEIROS HABITANTES DO ATUAL TERRITÓRIO DE ALTOS - PARTE 1: OS POVOS INDÍGENAS DO PERÍODO PRÉ-COLONIAL

Muito antes de Dâmaso Pinheiro de Carvalho, Domingos de Paiva Dias, João de Paiva Oliveira, ou qualquer outro homem de origem ou ascendência européia pisar no solo do território que muitos anos mais tarde iria formar a povoação dos Altos de João de Paiva, que mais tarde se tornaria, em 1922, a Vila de Altos, e, depois, Cidade de Altos, já viviam e passavam por essas terras muitos outros seres humanos… Saiba um pouco sobre os indígenas que habitaram (ou ao menos passaram), no período pré-colonial, nas terras que hoje conhecemos como Altos…

OS PRIMEIROS HABITANTES DO ATUAL TERRITÓRIO DE ALTOS - PARTE 1: OS POVOS INDÍGENAS DO PERÍODO PRÉ-COLONIAL
A dança dos Tarairiú, quadro de Albert Eckhout (1641)

De acordo com Odilon Nunes, “Os índios fervilhavam como formigas às margens dos rios e vales do Piauí” (1975). Na verdade, no período pré-colonial, o Piauí nem sequer existia nesse tempo. Nem Altos ou qualquer das atuais cidades piauienses. O que haviam eram os territórios dominados por diferentes povos indígenas, que não conheciam as fronteiras atuais.

Esses índios migravam muito de um local para outro, mas na maioria das vezes isso não ocorria em razão de não conhecerem as técnicas que pudessem permitir um certo sedentarismo. As razões para as migrações eram, no mais das vezes, os conflitos com tribos rivais, e, mais tarde, por perderem seus territórios para os homens brancos. Também era comum que uma determinada maloca crescesse muito, vindo a se dividir, indo parte dela se fixar em outro lugar, até para não esgotar os suprimentos de uma determinada região, prejudicando todo o grupo. Assim, era comum que um determinado grupo indígena, ocupasse vastas regiões. Também havia quem fizesse migrações sazonais, se deslocando em uma época do ano para um lugar, e, passado esse momento, retornado ao local anterior. Os períodos de seca e estiagem que sempre atingiram o nordeste do Brasil, certamente, foi também uma das causas de migração.

Dessa forma, é que é até um pouco complicado afirmar com segurança que apenas uma tribo tenha vivido na área hoje pertencente a Altos, ou se houveram mais. O certo é que muitos povos indígenas habitaram a região que hoje compreende o Município de Altos e cidades vizinhas. Outros, eventualmente, em suas migrações, ou andanças por motivos diversos, com certeza pisaram ou atravessaram o território que mais tarde viria a formar a cidade de Altos, até pela proximidade dos locais em que viviam, e por não se manterem esses povos indígenas, que por vezes até estavam também no território hoje pertencentes a outros estados do norte e do nordeste brasileiro, ou mesmo em outras regiões que não o nordeste, fixos, eis que estavam sempre se movimentando.

O Piauí é uma ponte bem definida ligando duas regiões distintas da América do Sul. (...).

Esta configuração determinou, sem dúvida, a transformação deste vasto território num corredor de migração para as tribos selvagens que se deslocavam da bacia do S. Francisco e do litoral nordestino para a bacia do Amazonas e vice-versa. Aqui endosso a opinião de Odilon Nunes, um dos maiores conhecedores da História do Piauí.

Tupis, Tapuias e Caraíbas, em guerras e contínuas migrações, pisaram o solo piauiense, cruzando-o nos dois sentidos. (...) (CHAVES, Monsenhor Joaquim. O ÍNDIO NO SOLO PIAUIENSE. 3. ed. Teresina: Fundação Cultural Monsenhor Chaves, 1995. p. 15-17).

 

Como consequência de sua bacia hidrográfica, o Piauí sempre foi um corredor de migrações. Os flagelados das secas, tocados pela fome, também testemunham a peculiaridade. É a bacia do Parnaíba passagem obrigatória dos retirantes, porque está situada entre as terras castigadas do Nordeste e as frescas e ubérrimas terras do Maranhão. A transumância, como fenômeno demográfico, manifesta-se mesmo nos períodos normais.

No passado mais remoto, compelidas por essas circunstâncias, palmilharam os vales de seus rios tribos dos principais grupos indígenas que povoaram o Brasil: tupis, caraíbas, tapuias e, entre estes, os cariris. (...) (NUNES, Odilon. Pesquisa para a história do Piauí. Rio de Janeiro: Artenova, 1975. V. 1. p. 24)

 

A área territorial que compreende o Piauí se constituía num corredor de migração, para inúmeras tribos que se deslocavam do vale do São Francisco em direção à região amazônica ou em sentido contrário e para as tribos que se movimentavam em sentido norte sul, da zona litorânea com destino ao Rio do Sono (Tocantins), ou vice-versa. No entanto, existiam tribos que, apesar de nômades, se fixavam por muito tempo em determinados lugares. Estudos indicam que o Piauí foi palco de encontro, de abrigo e de morada dos três grupos mais importantes de índios que habitaram o Brasil: Tupis, Tapuias e Caraíbas. (NETO, Adrião. Geografia e História do Piauí para estudantes: da pré-história à atualidade. 6. ed. rev. e atual. Teresina: Edições Grações 70, 2010. p. 198)

Um outro desafio para conhecer com alto grau de certeza a história dos indígenas que estiveram em Altos é o fato de que, apesar desses povos indígenas certamente terem sua história, não mantinham, ainda, um sistema de escrita que pudesse registrar o seu cotidiano. No máximo, haviam as pinturas rupestres, que deixaram em rochas espalhadas por todo o território piauiense. Só com muito esforço é que um historiador, recorrendo às ciências auxiliares da história como antropologia, arqueologia, etnologia, dentre outras, pode contar um pouco da história dos povos indígenas no período pré-colonial, aliando os vestígios materiais à memória transmitida pela oralidade, de geração a geração.

A história desses povos começa a se tornar mais rica de detalhes, quando a escrita chega com os primeiros desbravadores europeus a penetrar o solo piauiense, quando estes em diários, cartas ou documentos oficiais, passam a descrever um pouco os indígenas que aqui habitavam. Dessa forma, os relatos desses primeiros europeus a andarem por essa região, se constitui em rica fonte de como viviam os povos que habitavam essas terras e regiões vizinhas nos primeiros tempos do período colonial, quando ainda eram poucos os brancos europeus e os negros africanos por aqui e a cultura dos povos indígenas ainda era muito próxima do período anterior à colonização de nossa região.

O Padre Miguel de Carvalho, ao viajar pelos sertões do Piauí, já no período colonial, escreveu a sua "Descrição do sertão do Piauí, remetida ao Ilmº e Rvmº. Frei Francisco de Lima, Bispo de Pernambuco" (1697), na qual faz uma relação dos principais principais acidentes geográficos desta região recém-descoberta, acompanhando a enumeração de todas as fazendas de gado situadas nas diferentes ribeiras e olhos d'água. Conclui o trabalho com o arrolamento dos "nomes dos Tapuias que têm guerra com os morador.es da nossa freguesia de N. Senhora da Vitória".

Acredita-se que este religioso, em suas andanças tenha percorrido território hoje pertencente a Altos, Campo Maior, e outras cidades vizinhas, bem como muitas outras mais distantes, eis que teria partido da Freguesia de Nossa Senhora da Vitória (em Oeiras) e percorrido boa parte do que ficava ao norte do Piauí de então em 04 (quatro) anos de contínuas viagens "sem ficar rio, riacho, ou parte nomeada nesta Descrição que não tenha visto e andado", chegando próximo das terras da Serra da Ibiapaba (Guapava). De acordo com o Pe. Carvalho, tal era a distribuição espacial dos diferentes grupos tribais que habitavam o Piauí na época de suas andanças:

1. AROACHIZES: moram nas cabeceiras do Parnaíba

2. CARAPOTANGAS: moram na mesma parte

3. AROQUANGUIRAS: moram em· um riacho Savauhi, que entra no rio Parnaíba.

4. PRECATIS: moram no riacho lrussuí, que entra no Parnaíba.

ACURUÁS: moram nas cabeceiras da Goruguca.

6. RODELEIROS: moram na mesma parte e pelejam com rodelas.

7. BEIÇUDOS: moram na mesma parte e têm beiços tão grandes que no de baixo metem um botoque tamanho como uma grande laranja.

8. BOCOREIMAS: moram num riacho que se mete no Goruguca.

9. CUPEQUACAS: moram em um riacho que entra no Parnaíba.

10. CUPICHERES: moram na mesma parte e têm o cabelo muito comprido.

11. GUTAMES: moram no rio Mearim.

12. GOIIÁS: moram na mesma parte.

13. ANICUAS: moram nas cabeceiras do Rio Preto, comem brancos.

14. ARANHÊS: moram no rio Parnaíba.

15. CORERÁS: moram num riacho que se mete no Parnaíba.

16. AIITETUS: moram abaixo dos Corerás.

17. ABETIRAS: moram mais abaixo.

18. BEIRTÊS: moram na mesma parte.

19. GOARAS: moram no rio Parnaíba.

20. MACAMASUS: moram no Moni e Iguará.

21. NONGAZES: moram num riacho que entra no rio Parnaíba e comem brancos.

22. TRAMAMBÉS: moram junto da barra do Parnaíba, têm pazes com os brancos.

23. ANASSUS e ALONGAS: moram com os caboclos na Serra da Guapaba, para a qual se retiraram com medo dos brancos.

24. ARUAS: moram no riacho de S. Vítor, têm paz com os brancos.

25. UBATÊS: moram na serra do Araripe.

26. MEATÃS: moram na mesma parte.

27. CORSIAS: moram no rio Goruguea

28. LANCEIROS: moram na mesma parte.

29. ARAIÊS: moram nas cabeceiras do rio Piauí.

30. ACUMÊS: moram na mesma parte.

31. GOARATIZES: moram na cabeceira do rio Canindé.

32. JAICÓS: moram na mesma parte.

33. JENDOIS: moram junto a serra do Araripe.

34. ICÓS: moram na mesma parte , têm barbas grandes.

35. URIUS: moram na serra do Araripe

36. CUPINHARÓS: moram no rio Canindé, e são os que têm feito maiores danos nesta povoação e os Precatizes, que se enterram debaixo da terra pra fazerem esperas aos brancos, e com a barriga amarrada, com corda , correm mais do que cavalos, e não tocam a terra senão com as pontas dos pés (1697).

Consta ainda do texto do Padre Miguel de Carvalho (1697) a seguinte passagem:

"Estes sertões estão povoados de muitos Tapuias bravos, valentes e guerreiros, entre os quais se acham alguns que se governam com alguma rústica política, tendo entre si Rei e chamando seus distritos Reinos, como são os Rodeleiros, que se contam com sete reinos, e são tão guerreiros que até agora não foram batidos, nem de entre eles se tem apanhado língua, sendo muitas vezes acometidos por grandes tropas de (bandeirantes) paulistas. Pelejam com rodelas muito grandes, feitas de um pau chamado craíba, as quais na batalha levam uns e outros. Ao reparo delas pelejam com arco e flecha, lanças e cachaporas .. . (No caminho que leva ao Maranhão) vivem os tapuias bravos chamados Aroatizes e Goanarem, com os queis os brancos ajustaram pazes, que sendo firmes, serão em grande utilidade do comércio, por ficar o caminho sem impedimento .. . A terra dos Alongazes está por de traz dos riachos de Santo Antônio e Berlengas, correndo para a serra da Ibiapaba , para a qual fugiram os tapuias chamados também Alongaz, que nela moravam e de presente a têm os brancos povoadas com algumas fazendas de gados, situadas à beira de riachos que têm suas vertentes para o Norte ... Muitos mais sítios se têm descoberto nesta terra dos Alongazes para se lhe meterem gados, o que brevemente se fará, porque andam os moradores a competência qual tomará primeiro posse deles, e de presente levaram alguns gados os padres da Companhia (de Jesus) que vivem na serra da Ibiapaba, dizem que com intenção de povoarem estas terras na volta ... A região do rio Parnaíba é quase toda capaz de criar gado e não está povoada por causa do muito gentio bravo que na beira dele habita. Alguns morador es meteram lá gados e se retiraram com medo e . os que moram nas ·fazendas (desta região) andam sempre em contínua guerra e muitos pérderam as vidas nas mãos daqueles bárbaros, por cuja causa se não tem aumentado muito esta povoação pelas beiras daqueles famosos rios Parnaíba e Goroguca, os quais são abundantes de pastos e de muitas frutas... Esta abundância faz com que naquela terra habitem muitos tapúias, os mais bravos e guerreiros que se acharam no Brasil. .. " (1697)

O relato do Padre Miguel de Carvalho, datado de 1697, é, seguramente, um dos mais antigos a descrever a região centro-norte do Piauí. Contudo, sua interpretação, merece algumas considerações, como as apontadas pelo historiador Luiz Mott (2010):

Embora fidedignas as informações arroladas pelo Pe. Carvalho, posto que tinha perfeita ciência dos distritos {do Piauí), pois diz que "há 4 anos que ando sempre de viagens em contínuas lides, visitando estes moradores, sem ficar rio, riacho, fazenda ou parte nomeada nesta Descrição que não tenha visto e andado", malgrado seu pleno conhecimento da área, suas informações relativamente à, localização das aldeias indígenas por vezes é extremamente incompleta. E de todo impossível saber-se com certeza, por exemplo, em quais dos riachos " que entram no Paraíba" que moravam os Cupequacas, ou em que altura do mesmo rio viviam os Goarás ou os Nongazes. O rio Mearim, igualmente, é suiicien·temente extenso para tornar impossível saber com precisão onde viviam os Gutamés, desde que o Pe. Carvalho informa simplesmente: "Os Gutamés moram no rio Mearim". E assim por diante.

Outra observação quanto aos informes deste missionário, é quanto a utilização que faz de uma maneira bem peculiar de nomear os acidentes geográficos e mesmo as tribos indígenas. A serra da lbiapaba, p. ex., em seu texto aparece como "Serra da Guapaba"; o rio Gurguéia é chamado de "Goruguea "; os índios Tremembés são cognominados "Tramambés" os Longazes, de "Nongazes". Outra questão é quanto à inclusão de tribos localizadas em território há muito pertencente a outros Estados, e que o· Padre Carvalho arrola como sendo pertencentes à Freguesia de Nossa Senhora da Vitória (depois, Capitania do Piauí) - é o caso da Serra da lbiapaba, administrada de data imemoriável, pela Capitania do Ceará, e do rio Mearim, situado em território pertencente à Capitania do Maranhão. Mesmo o rio Parnaíba, como faz divisa entre o Piauí e o Maranhão, fica difícil saber se os tais índios que moram em riachos afluentes do dito rio, se estavam situados na sua margem direita (Piauí) ou à sua esquerda (Maranhão). (MOTT, Luiz. Piauí Colonial: população, economia e sociedade. 2. ed. Teresina, PI: APL; FUNDAC; DETRAN, 2010. p. 150-151)

Com base nas informações Luiz Mott, podemos atentar para o fato de que os índios Nongazes, que o Padre Miguel de Carvalho dizia que moravam em um riacho que entra no Parnaíba, eram os mesmos Alongazes ou Alongaz. E, tanto isso é verossímel, que os nongazes, segundo Miguel de Carvalho, habitavam uma riacho que desagua no Parnaíba, ao passo em que dizia que os Alongás moravam na Serra da Guapava (Ibiapaba). Em outro ponto, diz ainda que “ A terra dos Alongazes está por de traz dos riachos de Santo Antônio e Berlengas, correndo para a serra da Ibiapaba”.

Esclarecedor, para melhor compreender a exata localização da terra dos alongazes, a "Descrição da Capitania de São José do Piauí, 1772", redigida muito mais tarde, quando o Piauí já era uma Capitania com uma cidade (a capital estabelecida em Oeiras) e seis vilas (Valença, Marvão, Campo Maior, Parnaíba, Geromenha, Parnaguá), sendo o texto de autoria do então Ouvidor da Capitania, Antônio José de Morais Durão, que, então, visitou todos esses locais, descrevendo-os. Sobre a Vila de Campo Maior, informou que

"A freguesia da Vila e de todo o Distrito é da invocação de Sto Antônio do. Sorobi, por diferença do da Gorguea, porém ainda hoje a todo aquele território se chama 'O Langá '. Deriva-se aquele nome de uma nação de 'vermelho' (índios) assim chamados, que habitavam naquela ribeira e suas vizinhanças, enquanto não foram expulsos pelos reinóis, que entraram a descobrir e povoar aquela paragem. Assim também o de Carateus, no distrito de Marvão, que tomou o mesmo nome de outra nação assim chamada, por possuírem a dita ribeira e que se estendiam pela do Potí até a do .Parnaíba , ocupando uma grande porção de terras. (DURÃO, Antonio José de Morais. Descrição da Capitania de São José do Piauí. Oeiras do Piauí, 15 de Junho de 1772).

Ou seja, o riacho que Miguel de Carvalho dizia ser habitado pelos Nongazes era na verdade o Rio Longá, que desagua no Rio Parnaíba e nasce nas terras do atual Município de Alto Longá. Esses índios, ressalte-se, habitavam e andavam nas proximidades do Rio Longá, de onde tiraram o seu nome e seu território, com o tempo, se estendeu até a Serra da Ibiapaba, para onde já haviam ido, tentando evitar conflitos com o homem branco, alguns dos alongazes. Esses índios, em tempos imemoriais, fervilhavam às margens não apenas do Longá, mas também de seus afluentes, como, por exemplo, o Surubim, que nasce onde hoje fica o atual Município de Altos e deságua no Rio Longá, onde hoje fica o Município de Campo Maior. Outros afluentes importantes do Rio Longá seriam ainda, além do Surubim, o Matos, o Piracuruca e o Jenipapo. Habitando às margens do Longá e desses afluentes os indígenas alongás se espalhavam por boa parte do centro-norte piauiense, até as proximidades da Serra da Ibiapaba, área que ficou conhecida como Sertão dos Alongazes.

As aldeias Tapuias eram sempre construídas próximas a riachos ou rios para que os seus componentes tivessem facilidade em obter água e peixe. Era comum adotar o nome da aldeia o mesmo nome do rio em que eles vivam. (SANTOS, Juvandi de Souza. Cariri e Tarairiú?: culturas tapuias nos sertões da Paraíba. Porto Alegre, RS: Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas - PUCRS, 2009. p. 272)

Vale mencionar que o sertão dos alongazes compreendia, ainda que parcialmente, o atual território da cidade de Altos, que, nos primeiros tempos do Piauí Colonial, fazia parte do território original da antiga Vila de Campo Maior e da Freguesia de Santo Antonio do Surubim (a segunda freguesia religiosa piauiense, tendo sido a primeira de Nossa Senhora da Vitória.

Sobre a Terra dos Alongazes, Adrião Neto, em seu romance histórico Raízes do Piauí (2010) aponta que esta “constituía-se no habitat natural de muitas tribos, especialmente dos Crateús e dos Alongazes” (NETO, Adrião. Raízes do Piauí. ed. rev. melh. ampl. Teresina, Edições Geração 70, 2010. p. 57). Dessa forma, nota-se claramente que haviam ainda outras tribos em regiões próximas.

O Padre Cláudio de Melo, em sua obra "Os primórdios de nossa história", em que esmiúça as origens históricas da Vila de Campo Maior, cita a presença de outros indígenas na região próxima de Altos, Campo Maior e outros municípios que integravam o território da antiga Vila, mesmo antes dela ser constituída:

Em tempos bastante remotos, que brevemente os arqueólogos precisarão, viveram por estas paragens grupos humanos de uma civilização semelhante à dos povoadores da Serra da Capivara em São Raimundo Nonato. Em algumas de nossas Serras há vestígios de uma bem remota civilização. Como disto não temos história e nenhuma utilidade teriam as congnituras, nos limitamos a consideração apenas daqueles povos indígenas que habitaram o território, por época da ocupação branca.

Eram senhores destas várias paragens algumas tribos indígenas, geralmente de sangue tapuia, cuja ferocidade contra os brancos não se percebeu senão no caso isolado dos portugueses, e, de maneira duradoura, só naquele período que lhes fizeram caça a arma defogo. Esses índios "viviam muito isolados em pequenas tribos distintas e independentes umas das outras, fazendo-se guerra entre si e sempre às tribos tapuias" (THEBERGE, Dr. Pedro. Esboço Histórico sobre a Província do Ceará. Fortaleza: Henriqueta Galeno, 1973, p. 19).

São diversos os documentos que nos falam da existência desses selvagens no meio norte piauiense. Entre outros se distingue:

- Os Longás (Alongares, Alongazes), pacíficos senhores das margens do rio de igual nome, e que cedo foram aldeados pelos Jesuítas da Ibiapaba, a partir de1756, época da segunda missão naquela Serra;

- Os Potis, já oriundos do Oriente, provavelmente do Rio Grande do Norte ou suas froneiras com o Ceará e que foram escorraçados pelos brancos desde a conquista daquele território e ainda nos tempos das lutas do Capitão Domingos Rodrigues de Carvalho, que os imprensou além do Rio Parnaiba para os lados do Maranhão.

- também se fala dos Jenipapos, pequena tribo localizada entre os potis e os longás, cujo habitat primitivo parece ter sido ainda o Rio Grande do Norte.

- Na Serra da Ibiapaba reinavam vários grupos Tabajaras, aqueles por intermédio de quem nos veio a fé cristã;

- Nas cabeceiras do Poti estavam os Cararijús (Caratiús, Crateús) e aqueles outros tapuias, seus aliados do sopé da Serra, pelo lado do Piauí, e que foram quase exterminados pelos Tabajaras, vingando a morte do Pe. Francisco Pinto em 1608. (MELO, Padre Cláudio. Os Primórdios de Nossa História. In: MELO, Padre Cláudio. OBRA REUNIDA. Coleção Centenário, 103. Teresina: Academia Piauiense de Letras, 2019. p. 257)

Em artigo denominado "O Piauí, povoamento e expansão estadual", publicado no jornal "O Altoense" n° 16, ano 08, de março de 1995, página 02, o pastor evangélico e pesquisador Osvaldo Pessoa de Sousa fez, também, uma bela síntese sobre os índios que habitavam o Piauí nos primeiros tempos, bem como sua localização espacial, enumerando maior quantidade de tribos:

Antes que as terras do Piauí fossem descobertas e desbravadas, várias tribos de índios moravam em nosso rincão. No Delta parnaibano, os Tremembés, moradores por muitos anos. Os Quiriris numa vasta porção de terras compreendendo o Município de Piracuruca, rumo a Camucim e Viçosa. Os Longás, Aranhis, Quitaiaús, Quiratiús, estavam espalhados pelas terras de Alto Alegre, Castelo, Campo Maior, Alto Longá, São Miguel do Tapuio e partes do município de Altos. Os Potis, que habitavam à foz do rio do mesmo nome, que é um poderoso afluente do Parnaíba. Os Aroás, Gueguês, Acoroás, os quais ocupavam as terras de Amarante, Oeiras, Jaicós. Os gamelas, jenipapos, guararús, tinham suas malocas residenciais nas margens do Parnaíba. (...) Os Garibuçus, Muriparas, Muriparas, Ahitatús, Aboipiras, Ubajaras, Tapacuás, Tapacuás-Mirim, os quais habitavam as solidões do Parnaguá e margens dos rios Gurguéia e Uruçui, 2 afluentes do "Velho Monge". Os Pimenteiras viviam nas cabeceiras do Rio Piauí e terras adjacentes ao Pernambuco. Os Cupinharões e Jaicós habitavam nas margens do Rio Canindé. Os Ananás e Guacupês, vivendo na parte alta e média do afluente Piauí e região de Parnaguá. (SOUSA, Osvaldo Pessoa de. O Piauí, povoamento e expansão estadual. In: O ALTOENSE (jornal impresso – editor Francisco Ferreira Filho), Altos, PI, ano 08, nº 16, , março de 1995, . p. 2)

Cláudio de Albuquerque BASTOS (1994), em seu Dicionário Histórico e Geográfico do Piauí (em edição com acréscimos e atualizações de Adrião Neto), informa que Noé Mendes, na Revista Presença – n° 11, fez uma divisão geográfica dos territórios ocupados por indígenas piauienses do seguinte modo:

Norte: Aconguaçus, Aindoduçus, Anapurus, Anaçus, Caicaises, Cariris, Crateús, Curatês, Gamelas, Guacinduses, Guaranis, Jenipapos, Longás, Potis, Quitaiaris, Tabajaras e Tremembés.

Centro-Sul: Acaroás, Acumés, Aitatús, Amoipiras, Ananás, Aranhis, Aroás, Aroaquises, Aroquanguiras, Ararirés, Barbados, Beiçudos, Bocoreimas, Capeguacas, Carapotangas, Coarás, Corerás, Corsiás, Cupicheres, Cupinharões, Guacupês, Gurguéias, Icós, Irirês, Jaicós, Janduins, Lanceiros, Macoases, Moatans, Nongazes, Pimenteiras, Rodeleiros, Tapacoás, Timbiras, Ubatês e Ubirajaras. (In: BASTOS, Cláudio de Albuquerque. Dicionário Histórico e Geográfico do Estado do Piauí. Teresina: Fundação Culltural Monsenhor Chave – PMT, 1994. p. 312)

Jureni Machado Bittencourt Pereira (1989), historiador piracuruquense, sintetizou da seguinte forma a distribuição do indígena no território correspondente ao atual Estado do Piauí, durante o período colonial:

Nos relatos históricos, são abundantes as citações de tribos que povoaram a região da Ibiapaba e as terras interiores do Piauí. As nações Tabajara e Potiguara encabeçam a lista. Depois, aparecem Anacés, Acajús, Tarariús, Carathiús e Canindés. Nas terras baixas, entre a Ibiapaba e o Rio Parnaíba, aparecem os Potis, Aranhis, Aroás e Cupinharões. Para o norte figuram os Tacarijús e Alongás. No litoral aparecem os índios Tremembés. Nas margens do Rio Parnaíba, do lado Maranhense registram-se os Anapurus, mais conhecidos como índios Barbados. Para o sul do Piauí, registram-se os Gueguês, Gurguéias e Pimenteiras. (PEREIRA, Jureni Machado Bitencourt. APONTAMENTOS HISTÓRICOS DA PIRACURUCA. Teresina: COMEPI, 1989. p. 46)

Segundo a Professora Claudete Maria Miranda Dias (2010),

As populações nativas que habitavam o Piauí durante a colonização, faziam parte do grupo Tapuia e também Tupi, e ocupavam indiscriminadamente o litoral e os sertões. Até a chegada do colonizador viviam em comunidades, em harmonia com a natureza. As guerras e os rituais antropofágicos eram recursos utilizados em casos extremos. (In: DIAS, Claudete Maria Miranda; SANTOS, Patrícia de Sousa. História dos Índios do Piauí. Teresina: EDUFPI / Gráfica do Povo, 2010. p. 21)

De fato, apesar da visão tradicional de que os povos Tupis viviam mais na região litorânea, é preciso atentar que no interior do campus da UFPI, em Teresina, foram encontrados vestígios arqueológicos de povos Tupi. Do mesmo modo, em Miguel Alves, teria sido encontrada uma urna funerária de origem Tupi, o que demonstra que esses povos também adentraram o interior, em especial o centro-norte do Piauí. Do mesmo modo, índios que habitavam o interior do Piauí por vezes se deslocaram ao litoral, em especial na época dos cajus. Ainda que depois retornassem ao seu local de origem.

A. Gonçalves Dias, poeta maranhense autor do célebre poema “Canção do Exílio”, em suas “REFLEXÕES SOBRE OS ANAIS HISTÓRICOS DO MARANHÃO POR BERNARDO PEREIRA DE BERREDO”, fala dos índios que habitavam o Estado do Maranhão quando era governador Bernardo Pereira de Berredo (na época o Maranhão era formado pelo atual território do Ceará, Maranhão, Pará e Piauí), dizendo, sobre esses indígenas, que

Eles pertencem tanto a esta terra como os seus rios, como os seus montes, e como as suas árvores; e porventura não foi sem motivo que Deus os constituiu tão distintos em índole e feições de todos os outros povos, como é distinto este clima de todo e qualquer outro clima do universo. (DIAS, A. Gonçalves. Viagem pelo rio Amazonas – Cartas do Mundus Alter. Brasília : Senado Federal, Conselho Editorial, 2011. p. 29)

O “sertão piauiense”, segundo Jacob Manoel Gayoso e Almendra, era abrangente pela vastidão dos “rios Gurgueia, Canindé, Piauí, Poti, Longá, Piracuruca”, espaço geográfico característico dos povos indígenas considerados os “bárbaros”. (GAYOSO E ALMENDRA, Jacob Manoel. O feudo da Casa da Torre no Piauí – povoamento – luta pela propriedade. Edição do Centro de Estudos piauienses, caderno nº 2, série a, 1953. p. 5-10).

(…) Os sertões do Piauí, as serras, os vales e as chapadas serviam de abrigo e refúgio para as tribos da região do rio São Francisco, litoral nordestino e da bacia amazônica ou inversamente. (In: DIAS, Claudete Maria Miranda; SANTOS, Patrícia de Sousa. História dos Índios do Piauí. Teresina: EDUFPI / Gráfica do Povo, 2010. p. 23).

É dessa forma que haviam índios andavam da Ibiapaba ao Maranhão, indo por vezes até mesmo às regiões amazônicas. Por outro lado, os do litoral vinham para o interior, para os sertões, e vice-versa. Não raros haviam tribos, ou ao menos indígenas das mesmas famílias línguo-culturais que haviam no Piauí, em outros Estados como o Ceará, o Rio Grande do Norte, dentre outros, podendo encontrar-se registros de povos da mesma etnia dos que aqui viveram praticamente por todo o Nordeste do Brasil, ou até em outras regiões.

Hoje sabemos que não eram esses povos tão bárbaros quanto se dizia tempos atrás. Tinham conhecimentos muitos acerca de: a) caça; b) pesca; c) medicina natural; d) agricultura; e) astronomia; f) estratégias de combate; g) artesanato; h) espiritualidade / religiosidade; i) equilíbrio ambiental; j) expressões artistícas; k) território; l) ritos fúnebres; m) produção de armamentos e instrumentos de caça; n) culinária; o) mitologia; dentre outros. Na verdade, foi a visão eurocêntrica, em especial a extraída dos relatos dos primeiros europeus a pisarem esse solo, por não compreender seus costumes, quem os definiu como o que não eram: selvagens.

Com base no trecho de Miguel de Carvalho transcrito acima, Adrião Neto defende a idéia de que

Embora de forma rústica e incipiente, assim como os Tihuanacas, os Maias, os Astecas e os Incas, os índios do Piauí, também tinham a sua organização política administrativa. (NETO, Adrião. Geografia e História do Piauí para estudantes: da pré-história à atualidade. 6. ed. rev. e atual. Teresina: Edições Grações 70, 2010. p. 199)

Todavia, Dâmaso Pinheiro de Carvalho, “hum dos preadores, digo hum dos primrºs. povoadores da Capitania do Piauhy",  que chegou ao Sertão dos Alongazes em fins do século XVII, para pedir sesmaria que media "trêz legoas de terra de comprido com hua de largo em todo comprimto" e era "situada onde chama as cabeceiras do Riacho da Cobra e as tabocas nas testadas da sesmaria que foi do Mestre de Campo Domingos Jorge Velho" (sesmaria essa que muitos entendem como localizada em terras que mais tarde viriam a pertencer ao Município de Altos, como explicaremos em outra ocasião), o fez, alegando como mérito seu ao se dirigir ao governo português, o fato de que "tem ajustado a desinfestar dela muito gentio bárbaro que a habitava elonde possuuhia quantidade de gado vacum e cavalares dos quais tinha cituados alguns ocupantes" e revelando que ali tinha a intenção de trabalhar a terra visando à "criação do dito gado e suas multiplicações". A leitura do documento revela que em dita sesmaria habitava "muito gentio bravo", verdadeiros guerreiros tapuias que habitavam essas terras, que desde fins do século XVII já estavam em poder de Dâmaso, mas só no século XVIII ele obteve o título delas (Damaso Pinheiro de Carvalho, sesmaria concedida em 12/01/1715; confirmação em 14/09/1722. ANTT, Chancelaria de Dom João V, livro 60, ff. 226v-227v. Disponível em: . Acesso em 10 out. 2023). Uma visão no mínimo equivocaa sobre os indígenas que aqui habitavam, que revela a opinião de um dos lados da história.

A forma como os europeus, especialmente os de origem portuguesa, descreviam, no período colonial, os índios, é, na verdade, a responsável maior pela visão preconceituosa do índio como bárbaro ou selvagem. Na verdade não o eram. No período colonial assim foram tidos por terem resistido bravamente e enfrentado o português colonizador que buscava se assenhorar de suas terras. Uma visão etnocêntrica, que julgava os indígenas como uma cultura inferior, selvagem ou bárbara, tão somente por terem costumes diferentes dos costumes europeus.

Muitos estudiosos piauienses se ocuparam de tentar descrever esses povos que viveram no Piauí, de modo que aqui apenas vou tentar apresentar um pouco do que disseram acerca daqueles que habitavam o território hoje pertencente a Altos e outras regiões próximas, e, ainda, alguns que com eles guardavam relações e possivelmente estiveram por aqui.

João Gabriel Baptista (1994), nos fala dos Alongás, dos Potis, dos Aranhis, Cariri, Quitaiaús e dos Jenipapos, e, acrescenta como moradora da região próxima a Altos e Campo Maior, e que se aqui não moraram, ao menos eventualmente podem ter passado por estas terras, ainda a tribo dos ANAÇUS e a dos TACARIJÚS:

ALONGÁS (TREMEMBÉ) – Sambito e Ibiapaba. Em 1674, Dias de Siqueira instalou arraial junto às suas malocas. Em 1690, foi catequizada por Ascenso Gago, quando assaltava povoados da Casa da Torre, junto com a QUITAIAÚ. Em 1697, fugiu para a Ibiapaba, junto com a ANAÇU e a POTI. Foi pacificada em 1721 por Carvalho e Aguiar. Morou no Vale do Longá, em terras conhecidas como por "dos Alongazes". Foi aldeada de novo, pelos jesuítas, em 1766. Depois de 1766 passou a ser conhecida como LONGÁ: também ALONGAZES e ALONGARES.

(...)

ANAÇU (TREMEMBÉ) – Vivia com a ALONGÁ e, em 1697, vai com ela para a Ibiapaba, com medo do branco. Vivia no Longá. Também ANUÇU.

(...)

ARANHEM (TREMEMBÉ) – Em 1718 foi combatida por Xavier de Brito. É a mesma ARANHI.

(...)

ARANHI (TREMEMBÉ) – Era uma das três grandes divisões da nação TREMEMBÉ. Recebeu terras em 1686, de Souto Maior. Em 1674 foi derrotada por Carvalho e Aguiar. Foi encontrada no baixo Parnaíba, quando em 1716, em 1722 e em 1726 lutou contra Cavalcante de Albuquerque e Carvalho e Aguiar. Em 1731 guerreou contra Silva Pereira. Em 1778 conseguiu de Lobato e Castro licença para se instalar em São Felix da Boa Vista. Em 1811 estava agindo no Poti.

(…)

CARIRI (TREMEMBÉ) – Localização duvidosa. Penetrou no Piauí em 1692, quando foi combatida por Domingos Jorge Velho. Neste mesmo ano, uma de suas malocas foi destruída pelos Ávila. Em 1700 foi combatida por Pires de Brito, na Ibiapaba.

(...)

CRATEÚ (TREMEMBÉ) – Era uma das famílias mais importantes da nação. Dividia-se em AÇU e MIRIM. Também CARATEÙ, CARTEÚ, QUIRATEÚ e QUIRATIUÍ. Em 1695 foi pacificada por Carvalho e Aguiar e em 1697 por Ascenso Gago. Em 1703 pediu novo aldeiamento mas voltou às tropelias, com a ARANHI. Em 1708 lutou contra Castro e Silva e Carlos Ferreira. Em 1712 foi aldeada mais uma vez por Carvalho e Aguiar e frei Demescent, no delta do Parnaíba. Em 1716 foi combatida por Coelho de Andrade. Em 1811 atacava no Poti, junto com a ARANI. Suas pastagens habituais ficavam no vale médio e alto Poti.

(...)

JENIPAPOS (TREMEMBÉ) – Em 1712 se sublevou, junto com a ACROÁ e a ALONGÁ. Aderiu à rebelião de Mandu-Ladino, junto com a Poti. Foi para o Maranhão em 1713. Em 1721, outra maloca sua veio do Ceará com a ICÓ e a QUIXERARIU. Em 1726, outra informação diz que veio com Xavier de Gouveia, do Ceará ou do Rio Grande do Norte. Foi aldeada em 1728, mas não quis obedecer ordens de brancos. Morava entre a POTI e a LONGÁ.

(…)

ORARIJUS (TREMEMBÉ) – Ibiapaba, próxima à TACARIJU, de quem, segundo Thevet, era inimiga. Princípios do Século XVII.

(…)

PITIGIAR (TUPI: s/n) – Possivelmente no Sul do Piauí. Existia em 1790. Contra ela combateu o índio domesticado José de Sousa e Castro, em 1730.

(...)

POTI (TREMEMBÉ) – Morava no Rio Poti de sua foz às nascentes, desde o primeiro contacto em 1674. Em 1712 aderiu a Mandu-Ladino e lutou a seu lado até 1716. Em 1724 suas aldeias ficaram controladas por Carvalho e Aguiar. Foi um dos ramos dos Tremembés: os outros dois eram a ARANHI e a CRATEÚ. Em 1811 ainda agia no Poti, em suas nascentes. Outra versão informa que veio do Rio Grande do Norte, no tempo de Rodrigues de Carvalho. Também PUTI.

(…)

POTIGUAR (TUPI: s/n) – Segundo alguns autores era uma das nações existentes no Piauí, no século XVII; as outras seriam GUGUÊ, TIMBIRA e GOIAJARA. Entre 1662 e 1667 andou pela Ibiapaba, com dois religiosos. Em 1664, Dias D’Ávila prendeu 50 índios dessa tribo. Fixou-se na Ibiapaba, ao lado da TABAJARA. Devia ser a mesma tribo que era dada como CARIRI e PITIGUAR. Também PITIGUÁ.

(...)

QUIRATEÚ (TREMEMBÉ) – Próxima À Ibiapaba. Fez a paz com Ascenso Gago, junto com outras tribos, em 1690.

(...)

QUITAIAIU (TREMEMBÉ) – Ibiapaba. Fez a paz com Ascenso em 1690. Em 1697 fez nova paz, junto com a OCONGÁ e a CRATEÚ. Também QUITAIAÚ.

(...)

TACARIJU (provavelmente CARIRI) – Morava no vale do Poti, a oeste da Ibiapaba. Trabalhavam em cerâmica e possuíam agricultura rudimentar. Em 1585 foi visitada por Thevet. Em 1608 os Padres Pinto e Ferreira escreveram sobre ela. A12/01/1609 atacaram os dois jesuítas e mataram o Padre Pinto, sob torturas. Foi atacada, por vingança, pelos TABAJARA e foi totalmente destruída. Vivia em duas aldeias. Em 1608 deslocou-se para o Longá. Seus remanescentes ficaram, em 1718, com Coelho e Carvalho, com quem demoraram até 1730. Em época desconhecida, antes disso, moraram no local Cabeça do Tapuio, que abandonaram e onde Carvalho e Aguiar construiu uma fazenda. Também TUCURIJU, CARAIJÚ, TUJAPARA, era ainda chamada de TAPUIA DO OCIDENTE.

(…)

TUPINAMBÁ (TUPI: s/n) – Veio de Pernambuco. Fixou-se no litoral, em data não determinada. Deu origem a várias tribos.

TUPI (TUPI) – Viveu no litoral em data indeterminada, provavelmente na Pedra do Sal. (BAPTISTA, João Gabriel. ETNOHISTÓRIA INDÍGENA PIAUIENSE. Teresina, PI: UFPI / APL, 1994. p. 96-107)

Cláudio de Albuquerque BASTOS (1994), em seu Dicionário Histórico e Geográfico do Piauí (em edição com acréscimos e atualizações de Adrião Neto), também menciona alguns desses indígenas que teriam vivido nas proximidades de Altos e de cidades vizinhas, no que chamamos de Piauí Pré-Histórico:

ANAÇÚS – Índios descritos pelo pe. Miguel de Carvalho (1697). Moravam com os caboclos na serra da Ibiapaba, para a qual se retiraram com medo dos brancos. (p. 37)

(...)

ARANÍS – Índios. Também chamados de Aranhez. Ao que se presume sub-ramo dos Tremembés. Estavam na Ribeira do Parnaíba (1697 e 1731). Foram combatidos em 1716, 1722 e 1726. Provisão Régia de 31-8-1731 trata de licença impetrada por Manoel da Silva Pereira, morador da ribeira do Parnaíba, para fazer guerra às suas custas ao gentio Aranis, Anaperis, Iaçui, e outros. Portaria de 11-10-1758 do governador do Estado do Maranhão e Piauí concedeu licença ao principal desses índios para se transportar para o lugar São Félix da Boa Vista, nos limites da freguesia de São Bento de Balsas, vizinha do Rio Parnaíba, com as famílias da mesma nação, e irem gozar naquela notável situação dos grandes interesses que na mesma se lhe ofereciam, sob a conduta do cap. João do Rego Castelo Branco. Entre os que os combateram figura Bernardo de Carvalho e Aguiar.(p. 41)

(…)

CARIRIS – Índios. Ramo dos tapuias. Também chamados Quiriris. A maior parte dos índios do Piauí era do ramo Cariri, cuja palavra significa tristonho, calado, silencioso. Os cariris constituem ainda problema obscuro para os etnólogos. Uns classificam-nos como grupo autônomo, outros como mestiços resultantes de aruaques e caraíbas, e ainda outros, mistura de tupis e tapuias. Em verdade, há contatos culturais entre os cariris e os aruaques e caraíbas. Deles descendem os Tremembés e destes os Crateús, Potis e Aranhis. Ocupavam a região dos rios Itaim (Poti) e Piracuruca. Foram destroçados pelo mestre-de-campo Francisco Dias d’Ávila. O paulista João Pires de Brito, por volta de 1700/1, combateu-s nas chapadas e taboeiros de Piracuruca, juntamente com Francisco Dias de Siqueira. (p. 110)

(...)

CRATEÚS – Ìndios tapuias. Também chamados Carajirús ou Caratiús. Sub-ramo dos Tremembés. Habitavam as cabeceiras do Poti, de onde foram expulsos mais tarde para o N. Concluiu-se, em 1701, a guerra contra esses e outros indígenas do Maranhão e Piauí, no que foram reprimidos pelo governo de Pernambuco, quando em 28-10-1708 determinou ao cap. Bernardo Coelho de Andrade que fizesse guerra crua ao gentio bárbaro dessa nação e dos Crateús-mirins, cujas presas deveriam ser levadas à sua presença para se tirar o quinto real e distribuírem os demais. Quase foram exterminados pelos Tabajaras, vingando a morte de pe. Francisco Pinto, em 1608. (p. 152)

(...)

JENIPAPOS – Índios tapuias enviados do Ceará, com suas mulheres e filhos para ajudarem na guerra que se fazia no Maranhão aos índios inimigos. Pequena tribo localizada entre os Potis e os Longás. Em 1712, estando já no Piauí, próximos ao Maranhão, em companhia do fr. Euzébio Xavier de Gouveia, fugiram em virtude do procedimento deste. Atravessaram o Parnaíba e invadiram fazendas no Maranhão. Tal feito motivou provisão de 28-1-1728, do Conselho Ultramarino, ao governador do Maranhão, mandando expulsar esse religioso da capitania. (p. 327-328)

(...)

LONGÁS – Índios. Também chamados Alongares, Alongás e Alongases. Habitavam a região atual de Alto Longá, à margem direita do rio Longá. Antes de 1697, haviam fugido para a Serra da Ibiapaba, com medo dos brancos. Em 1712, levantam-se. Em correrias atravessam o Parnaíba e atacam fazendas do Maranhão. Pacificados pelo mestre-de-campo Bernardo de Carvalho e Aguiar, em1721. Aldeados pelos jesuítas na serra da Ibiapaba, a partir de 1756 (pe. Cláudio Melo). (p. 348-349)

(...)

POTIS – Índios tapuias. Subramo dos Tremembés. Habitavam a foz do Rio Poti. Oriundos provavelmente do Rio Grande do Norte ou suas fronteiras com o Ceará. O cap. Domingos Rodrigues de Carvalho os imprensou além do Parnaíba para os lados do Maranhão. Rebelaram-se em 1712. Em correrias atravessaram o Parnaíba e atacaram fazendeiros de gado do Maranhão. Os homens tinham o cabelo comprido até a cintura, às vezes trançados ou enastrados com fitas de fio de algodão. As mulheres andavam com cabelos tosquiados e usavam franjas de fios de algodão. Cantavam. Os lábios furados acomodavam pedras roliças e compridas. (p. 466)

(…)

QUIRATEÚS – Ver: Crateús (índios).

QUIRIRIS – Ver: Cariris.

QUITAIAÚS – Índios. (p. 476)

(...)

TABAJARAS – Índios tapuias. Uma das cinco tribos que efetivamente habitaram o Piauí. Povoaram a bacia do Parnaíba. Os primeiros tabajaras, moradores da Ibiapaba, onde estiveram aldeados em 1607, de 1656 a 1662 e em 1695, eram descendentes dos que vieram pelo São Francisco acima, atravessaram os sertões que formam o divisor de águas, alcançando o Piauí, a serra do Araripe e, finalmente, Ibiapaba que lhes serviria de moradia por longos anos e, onde, mais tarde, chegaram novas levas vindas pelo litoral. O péssimo inverno os fez retornar à serra da Ibiapaba. Guerrearam os Crateús quase exterminando-os, tentando vingar-se da morte do pe. Francisco Pinto, em 1608. (p. 551)

(...).

TACARIJUS – Índios. Habitavam a Serra da Ibiapaba, de onde passaram ao Piauí. Eram originários do Rio Grande do Norte. (1994). (p. 552)

(...)

TREMEMBÉS – Índios do litoral. De nação tupi (Schwennhagen e Abdias Neves) ou tapuias (Martim Soares Moreno e Odilon Nunes), do ramo Cariri, e que transmitiram o nome do seu grupo ao rio que dominavam em seu curso inferior (rio grande dos Tapuias). Abdias da Costa Neves os classificou em três ramos: Crateús, Potis e Aranis, o que já se comprovou para os dois primeiros. Martim Soares Moreno, que conhecia muito bem a língua tupi, quando anuncia (1613) a paz que fizera com esses índios, diz que eles são tapuias. Consignados nos primeiros documentos referentes ao N do Brasil, ocuparam por dilatados anos o delta do Parnaíba e grande parte do Maranhão e Ceará. Uma das cinco tribos que, efetivamente, habitaram o Piauí. Desde o século XVI mantinham contato com os brancos. (…) (p. 567)

(…)

TUPINAMBÁS – Índios. Os Amoipiras eram conhecidos como um de seus galhos. (p. 570)

O relato desses estudiosos, embora tragam importantíssimas informações e, em muito, tenham contribuído para uma etno-história dos indígenas piauienses, eventualmente trazem informações conflitantes quando comparadas uma com a outra, as quais, em artigos futuros, pretendo buscar elucidar, para se chegar a um consenso, ao menos acerca dos indígenas que habitaram ou estiveram em nossa região.

É justamente por isso que esse artigo é apenas a primeira parte do que pretendo publicar sobre os povos que aqui habitavam no Perído pré-colonial, e, inclusive, investigando suas origens. Adiante prometo publicar informações mais detalhadas sobre cada uma dessas tribos, nações e etnias.

Por ora posso dizer, que existiram, de fato, indígenas habitando as terras hoje chamadas de Altos em um passado remoto, tanto no período pré-colonial, como ainda que por breve período, já no período colonial. E existem vestígios materiais disso. Aqui em Altos mesmo, de acordo com minha compreensão, podem ser encontrados muitos vestígios possivelmente deixados por povos indígenas (o que carece de confirmação) em vários pontos, como, por exemplo, na região entre Altos e Coivaras, no próprio Município de Coivaras (que já foi parte de Altos), nas regiões do Quilombo e dos Anajás, etc. É possível mesmo que, além daqueles sobre os quais já falamos, ainda outros povos tenham vivido ou passado no território que viria a formar o Município de Altos. Sobre isso falaremos em outro momento. Talvez até trazendo mais informações do que aquelas das quais disponho no momento.

De já saliento a necessidade de compreendermos melhor as nossas origens, os primórdios de nossa história. Muita coisa aconteceu antes de João de Paiva (o filho) ter, em fins do século XIX, começado a dotar de feições urbanas a povoação que mais tarde, em 1922, viria a conquistar autonomia política com o nome de Vila de Altos. É preciso voltar os olhos mais para trás, afim de realmente reconstituir a história altoense, eis que, na terra que mais tarde seria chamada de Altos, muita coisa aconteceu antes de João de Paiva. Nesse sentido, é que voltaremos, para esmiuçar o assunto, a falar, de forma mais detalhada e detida, dos indígenas que viveram nessa região (ou ao menos que possam ter passado por aqui). Falar dos povos indígenas não é tarefa das mais fáceis, mas espero dar minha contribuição no sentido de fazer avançar os estudos referente a essa gente.

 

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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

 

 

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